A Ética Argumentativa

A Ética Argumentativa

Mesmo quando Hoppe aponta os principais pontos da dialética marxista, o autor apresenta a sua própria metodologia de análise e estruturação do pensamento: a Ética Argumentativa.

Antes de apresentar os elementos da Ética Argumentativa, se faz necessário abordar a ordem natural em comparação com a ordem antinatural. A ordem natural, para Hoppe, corresponde ao mercado onde não há intervenção estatal do mesmo modo que a propriedade privada, sem a existência de um Estado, a ordem antinatural é o Estado pois é uma ordem criada e inventada e que de natural nada tem, constitui acima de tudo uma forma de coerção de uns sobre outros. E que todo e qualquer conflito tem origem no fato de que vivemos em um mundo de escassez. Sendo assim, é válido concordar que:

a) O nosso corpo é um recurso escasso. É um recurso porque, segundo o axioma da ação humana, ele é o meio ao qual o indivíduo recorre para atingir um fim, através da realização efetiva da ação. E é escasso porque, segundo o mesmo axioma, eu não poderia atingir dois fins ao mesmo tempo com este mesmo recurso.

b) Todos os outros recursos também são escassos, isto é: só podemos realizar um fim a cada instante de tempo com esse recurso. Se algum recurso não fosse escasso, então eu poderia realizar todos os fins que eu desejo com esse mesmo recurso, e, por conseguinte, alcançaria um estado de satisfação plena e passaria a não agir mais, violando o axioma da ação humana, o que é impossível.

c) Disso, podemos concluir que todo e qualquer conflito se dá quando: i) um indivíduo resolve utilizar o corpo do outro para o seu próprio fim. Por exemplo: o indivíduo A segura o indivíduo B. Isso significa que o indivíduo A está utilizando o recurso escasso do indivíduo B, seu corpo, para atingir os seus próprios fins. Isso gera um conflito porque o indivíduo B já está utilizando esse recurso escasso, seu próprio corpo; e ii) dois indivíduos resolvem utilizar o mesmo recurso escasso ao mesmo tempo. Por exemplo: o indivíduo A colhe uma maçã para comer, e o indivíduo B pega a maçã do indivíduo A, também para comer. Como a maça é escassa, surgiu um conflito nesse processo: ambos querem utilizar a mesma maça para seus fins.

d) Se todos os conflitos emanam do fato de dois indivíduos utilizarem um mesmo recurso escasso ao mesmo tempo, então, se quisermos conhecer uma regra, uma ética, que devemos seguir para evitar tais conflitos, essa ética deve ser uma norma de propriedade, um direito de controle exclusivo sobre os recursos escassos, isto é, qual indivíduo A possui direito de controle exclusivo sobre o recurso X.

A Ética, portanto, possui como objetivo precípuo evitar conflitos entre indivíduos. Se a Ética for seguida por todos os indivíduos, os indivíduos nunca podem entrar em conflito. Isto é, não podem existir contradições internas quando a ética é aplicada indefinidamente. Se a Ética gerar um conflito interno, ela não mais poderá ser considerada como Ética, por definição.

A Ética é normativa, isto é, ela diz o que deve ser feito, e, no caso da Ética Argumentativa, mais especificamente, o que não deve ser feito. Isso implica no fato de que a Ética pode ser violada, indivíduos podem escolher não seguir a Ética.

Já em relação as características da argumentação podem ser definidas com: i) a argumentação é necessariamente uma ação humana, e, portanto, pressupõe a utilização do nosso corpo, um recurso escasso, como meio; ii) a argumentação é uma atividade específica de busca pela verdade, a busca por justificar a validade das proposições. Como tal, os indivíduos que argumentam buscam o concílio, isto é, concordarem ao menos que discordam; iii) assim, a argumentação é uma ação livre de conflitos, uma interação que busca a concordância entre os indivíduos argumentadores a respeito do valor verdade de uma proposição ou argumento; e iv) um indivíduo precisa reconhecer o outro indivíduo como um ente exterior a si, que possui autonomia sobre as suas ações e sobre os recursos que necessita para propor as suas proposições, tornando possível que ele convença ou seja convencido através dos argumentos.

Neste contexto fica claro que se for justificar uma Ética, ela deve dizer o que é propriedade de quem para que os indivíduos que sigam a ética nunca entrem em conflito. Portanto, a seguir será apontado o esquema de proposições descritivas que justificam racionalmente da Ética Argumentativa:

a) Todas as tentativas de afirmar que uma proposição é verdadeira, falsa, indeterminada, ou se um argumento é válido ou não, ocorrem e são justificadas no curso de uma argumentação. Essa proposição não pode ser tomada como falsa sem cair em uma contradição, porque a tentativa de refutá-la se daria justamente através da argumentação.

b) Para justificar alguma proposição, é necessária a argumentação. Disso, podemos concluir que toda e qualquer tentativa de justificar uma Ética é, necessariamente, através da argumentação.

c) Na argumentação está implícito, como condição formal a priori, o reconhecimento do direito de auto propriedade.

d) Se uma pessoa argumentasse contra o direito de auto propriedade, ela cairia em contradição performativa, visto que no ato de argumentar ela já demonstra reconhecer esse direito.

e) Logo, a única Ética que pode ser justificada racionalmente é a Ética Libertária, da propriedade privada, aqui nomeada Ética Argumentativa. As outras Éticas poderiam ser propostas, mas cairiam em contradição performativa.

f) Temos, então, que a Ética Argumentativa é a pressuposição praxeológica da argumentação.

Podemos concluir, então, que a justificativa da Ética Libertária é composta apenas por termos descritivos verdadeiros e a priori, e que, portanto, pode ser derivada e conhecida a partir da razão. Como sabemos que questões do que é justo, válido, certo, surgem apenas no curso de uma argumentação, e a argumentação é uma ação humana, então a Ética aqui defendida está circunscrita à praxeologia, e, portanto, só se aplica à classe de seres que possuem como atributo ontológico a capacidade argumentativa. Percebemos também que não derivamos nenhuma norma de algum fato, nenhum dever ser de um ser, logo, a Ética Argumentativa não cai na Guilhotina de Hume.